A vida, desde o seu início, está condenada a uma submissão silenciosa ao sistema tributário. Esse mecanismo invisível, porém implacável, controla cada etapa da existência humana, impondo tributos que drenam o esforço e o trabalho de forma sistemática. A falsa sensação de liberdade financeira nos acompanha, vendendo-nos a ideia de que nossos bens, nosso salário e nosso patrimônio são inteiramente nossos. Mas, na realidade, não há verdadeira posse—há apenas concessões temporárias, condicionadas ao cumprimento das obrigações fiscais. Tudo o que adquirimos, tudo o que construímos, tudo pelo que lutamos carrega consigo o peso de tributações recorrentes que garantem que jamais sejamos realmente donos daquilo que possuímos. A propriedade, que deveria representar um direito absoluto, transforma-se em um aluguel perpétuo, um contrato implícito no qual o Estado se mantém como coproprietário do que chamamos de nosso.
Antes mesmo de tocarmos o próprio salário, ele já foi fragmentado. O Imposto de Renda toma sua fatia, o INSS absorve outra parte, e contribuições diversas garantem que apenas um percentual do que foi conquistado chegue efetivamente às mãos do trabalhador. Não há negociação, não há escolha, apenas aceitação. Quando finalmente se consome o que sobrou, há mais impostos ocultos. O pão que alimenta carrega ICMS, os produtos industrializados acumulam IPI, os serviços essenciais trazem ISS. O custo real de viver não está no valor pago pelos bens, mas nos tributos invisíveis que silenciosamente recaem sobre cada transação, transformando o simples ato de sobrevivência em uma arrecadação contínua.
Adquirir um imóvel, supostamente um dos símbolos máximos da conquista financeira, é, na verdade, ingressar em um ciclo de cobranças permanentes. O ITBI taxa sua compra, o IPTU se torna uma obrigação anual, e taxas cartoriais adicionam camadas de burocracia financeira sobre o que deveria ser um bem legítimo. Se um dia for vendido, o Estado volta a cobrar sobre a valorização do patrimônio, garantindo que até o crescimento financeiro seja taxado. O mesmo ocorre com veículos. O preço final não reflete apenas o custo da produção, mas sim um acúmulo de impostos indiretos. O IPVA, renovado todos os anos, nos lembra que a posse de um carro não é um direito absoluto, mas uma concessão paga anualmente ao Estado. Licenciamento, seguros—cada mecanismo criado para garantir segurança financeira também embute tributos, aumentando a carga daquilo que deveria representar estabilidade.
A ilusão da posse é cruel. A casa que chamamos de nossa pode ser confiscada por falta de pagamento do IPTU. O carro que dirigimos pode ser apreendido se o IPVA estiver atrasado. Compramos, mas nunca possuímos por completo. Mantemos apenas o direito temporário de uso, condicionado ao cumprimento das regras do sistema. A submissão é sutil, mascarada pela ideia de progresso financeiro. O dinheiro flui, mas sua circulação sempre reverte ao mesmo destino—ao Estado, que assegura sua parte em cada transação, em cada conquista, em cada esforço.
Tentamos proteger o que acumulamos. Buscamos seguros, investimos, planejamos. Mas cada alternativa carrega encargos embutidos. O IOF recai sobre operações financeiras, os impostos sobre rendimentos drenam lucros antes que possam ser desfrutados. Nenhuma estratégia nos livra da engrenagem tributária, que se ajusta para capturar cada oportunidade de crescimento e taxá-la devidamente. Trabalhar mais significa pagar mais. Crescer significa contribuir mais. Cada etapa da ascensão financeira é proporcionalmente acompanhada de uma obrigação fiscal que limita os ganhos e perpetua o ciclo de arrecadação.
E se há uma certeza absoluta, é que mesmo na morte o sistema não encerra sua cobrança. O funeral tem impostos embutidos, taxas elevadas e serviços tarifados. O patrimônio deixado para os filhos e familiares não é inteiramente deles. O ITCMD exige sua parte, tributando a herança como se fosse um privilégio concedido pelo Estado, reduzindo o que deveria ser um legado legítimo. E assim, mesmo ao fim da existência, a arrecadação continua, garantindo que nenhuma fase da vida escape do sistema tributário. A morte não liberta—ela apenas transfere a obrigação financeira para os que ficam.
A corrida dos ratos define esse ciclo com perfeição. Corremos sem parar, acreditando que mais esforço nos tirará dessa engrenagem. Trabalhamos mais para ganhar mais, mas quanto mais se ganha, mais somos taxados. Buscamos estabilidade financeira, mas a cada conquista surgem novas obrigações fiscais. Nunca estamos à frente—apenas mantemos o ritmo daquilo que nos foi imposto. A liberdade financeira prometida não passa de uma ilusão, uma cenoura pendurada à frente do trabalhador para mantê-lo correndo eternamente. O sistema é perfeito em sua engenharia. Mantém todos em movimento, mas nunca permite que alguém saia da roda.
O ciclo da submissão ao sistema tributário nunca se encerra. Ele transcende a vida e a morte, garantindo que toda produção, toda posse e toda sucessão de bens continuem dentro da engrenagem. Trabalhamos para pagar, pagamos para sobreviver, e até no descanso final, o sistema estende sua mão para colher sua fatia. A ilusão da posse nos acompanha do primeiro ao último dia. A corrida dos ratos nos prende em um labirinto onde cada caminho leva ao mesmo destino. O preço invisível da existência não está apenas nos desafios diários—mas na certeza de que, independentemente do que conquistamos, nunca seremos verdadeiramente donos de nada.
"Vivemos sob a ilusão da posse, mas tudo que tocamos já pertence ao sistema. Pagamos ao nascer, pagamos para viver, pagamos ao consumir, pagamos para proteger, pagamos até ao morrer. O trabalho rende, mas o Estado toma sua fatia. O patrimônio cresce, mas sua permanência depende do tributo. Até a última herança é cobrada. A corrida dos ratos não tem linha de chegada—apenas a certeza de que, enquanto houver vida, haverá cobrança."
Reflexão por Roberto Ikeda
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